quarta-feira, 6 de novembro de 2013

JUSTIÇA DIVINA. – O Mérito Glorificante.

Retiramos de O Livro dos Espíritos em seu Livro 2º, cap.I - Dos Espíritos, no subcapítulo intitulado - Progressão dos Espíritos, alguns ensinamentos sobre a justiça divina e sobre o mérito alcançado mediante o esforço individual.
O it.115 traz a seguinte pergunta:
“Uns espíritos foram criados bons e outros maus?
 Deus criou todos os espíritos simples e ignorantes, ou seja, sem conhecimento”.
E mais, no it.120 segue a pergunta:
"Todos os espíritos passam pela fieira do mal, para chegar ao bem?
 Não pela fieira do mal, mas pela da ignorância".
Estas duas respostas nos revelam que Deus não criou a todos iguais, mas sim, criou a todos segundo um mesmo critério, preservando a individualidade de cada ser. Podemos interpretar que Deus deu a todos o mesmo ponto de partida, para que assim, possamos afirmar que todos são iguais perante Deus. Mas cada um conserva em si sua individualidade; cada ser é único. Deus ao criar a vida concede o livre-arbítrio, evidenciando seu amor e liberando o ser a seguir sua vontade conforme melhor lhe desejar. A pergunta do it.117 traz:
"Depende dos espíritos apressar o seu avanço para a perfeição?
 Certamente. Eles chegam mais ou menos rapidamente, segundo o seu desejo e sua submissão à vontade de Deus".
Portanto, podemos considerar que Deus concede à criatura a liberdade de ação; a ação de agir conforme o que seja melhor para si. Por outro lado, Deus criou Leis que regem o universo, dando-lhe estabilidade e ordem, tanto no mundo material quanto no mundo espiritual. Leis essas perfeitas e imutáveis, ou seja, sem relativismos; elas expressam a real vontade de Deus, que por ora escapa ao entendimento humano. A conclusão óbvia é que, aquele que age em conformidade com essas Leis, em conformidade com o ordenamento a que o universo foi criado, submete-se à vontade soberana de Deus e alcança mais rapidamente o estado de perfeição espiritual e moral, desfrutando da felicidade plena.

Os seres de elevada moral são os mais submissos à vontade de Deus, pois agem em conformidade com Suas Leis e, portanto, são aqueles onde suas ações têm maior abrangência no universo; suas ações não irão abalar a estabilidade e ordem universal, e não resultarão em sofrimento à outros seres. Alcançaram por seus méritos maior liberdade de transitar pelo universo, nada a eles é impedido, pois contribuem para a ordem da criação.

Os seres de moral inferior, por outro lado, ainda não compreendem as Leis do ordenamento universal, por ignorância ou rebeldia, portanto, o raio de abrangência de suas ações é limitado. E é esta a condição do ser humano no planeta Terra, que abriga seres de condição moral semelhante. Porém, na Terra, ele encontra todos os recursos para alcançar um nível de conhecimento e de moral superior; se não em uma existência, encontrará em outra, bastando a ele apenas empregar sua força de vontade.

Seria justo os ignorantes e rebeldes terem acesso aos locais de moradia - me refiro aqui às moradias celestes dos seres superiores - daqueles que obedecem a vontade de Deus? Seria justo Deus permitir que os desordeiros transitassem livremente pelo universo espalhando o caos e o sofrimento?

Ainda, a Terra nesse sentido seria um local de contenção até que a criatura adquira a capacidade de, livremente, expressar-se por toda a parte.

Para maior compreensão seria interessante a leitura de todo o subcapítulo - Progressão dos Espíritos - que compreende os itens de 114 a 127.

A condição de felicidade e de conhecimento em que cada um se encontra vem do mérito decorrente do esforço próprio em melhorar-se e aprender; do melhor ou pior aproveitamento dos recursos e oportunidades que Deus oferta igualmente a todos, cumprindo-se a máxima de Jesus: "A cada um segundo suas obras".

Corroborando com esta citação de Jesus, encontramos em O Evangelho Segundo o Espiritismo no cap.XXV, no it.3, este trecho:
"(...) Busca e acharás, trabalha e produzirás, pois desta maneira serás filho das tuas obras, terás merecimento e serás recompensado conforme houveres produzido".
Assim, com a Lei de progresso se junta a Lei de trabalho, pois é o trabalho que movimenta as forças da inteligência.

A pergunta que se faz é: qual o ponto de partida do qual Deus criou a todos? A doutrina espírita ajuda-nos a compreender alguns pontos lançando luz no entendimento da justiça da criação, mediante os ensinos dos espíritos superiores. Sem a presunção de desvendar os mistérios de Deus, apresento três trechos para o início do entendimento.
Emmanuel em seu livro Emmanuel, no cap.XVII intitulado Os Animais — Nossos Parentes Próximos, na pág.95 coloca: 
“E, como o objetivo (...) é o estudo dos animais, sinto-me à vontade para declarar que todos nós já nos debatemos no seu acanhado círculo evolutivo”.
Ainda Emmanuel em seu livro Roteiro, cap.IV, pág.23, coloca:
“O corpo é para o homem santuário real de manifestação, obra-prima do trabalho seletivo de todos os reinos em que a vida planetária se subdivide”.
No livro Apometria Vista do Além, no cap.V, pág.112, Ismael Alonso é ainda mais evidente neste trecho:
“Ao longo de nossa jornada evolutiva passamos por todos os reinos e chegamos onde estamos”.
A criatura inicia sua trajetória evolutiva na condição mais simples de vida, e segue estagiando sob os outros diferentes tipos de formas de vida - unicelulares, plantas, animais, homem - percorrendo através de inúmeras reencarnações o caminho rumo à sua evolução mental e espiritual. Deus, fonte de infinito amor, não privilegia uns em detrimento de outros; em se criando seres superiores estaria estabelecendo categorias que desfrutariam de vantagens, aptidões e regalias. Estas classes de seres superiores estariam privadas dos sofrimentos dos seres inferiores. Ademais, uma vez estabelecido as categorias superiores, haveria uma escolha sobre quem pertenceria a esta ou aquela categoria, e estaria instituído uma injustiça, inadmissível a um ser soberanamente bom e justo. E como último argumento, aos seres ditos superiores lhes seria tirado o mérito de suas conquistas privando-os dos frutos pelo trabalho que não realizaram, pois já foram criados "prontos". O mesmo raciocínio aplica-se comparando o ser humano com os animais irracionais.

A transição do princípio inteligente contido no animal para o ser humano, entretanto, não segue uma linearidade tão simples. As diferentes espécies de animais não procedem intelectualmente umas das outras, por via de progressão. A questão 607-a contida no cap.XI de O Livro dos Espíritos, intitulado Os Três Reinos, mostra que o princípio inteligente sofre uma transformação para daí tornar-se um espírito, momento no qual começa para o ser o período de humanidade, e com este a consciência do seu futuro, a distinção do bem e do mal, e a responsabilidade dos seus atos. O homem passa a possuir uma alma ou espírito, centelha divina que lhe dá o senso moral e um alcance intelectual que os animais não possuem. Neste instigante capítulo lemos, porém que, a aquisição da consciência, ou o ponto de partida do espírito é uma dessas questões que se ligam ao princípio das coisas, e estão nos segredos de Deus. Transcrevo um trecho deste capítulo:
"Qual é a origem do espírito? Onde está o seu ponto de partida? Forma-se ele do princípio inteligente individualizado? Isso é um mistério, que seria inútil procurar penetrar, e sobre o qual, não se pode mais que construir sistemas". 
Por ora o que o homem pode apreender é que a Lei de Evolução indica que a criatura passa por diversos estágios, pois todos foram criados simples e ignorantes. Todos têm um mesmo ponto de partida com aptidão igual para progredir, mediante sua atividade individual. Para ser perfeita, a justiça divina não pode eleger privilegiados ou constituir alguns melhor dotados que os demais, dispensando do trabalho que seria imposto a outros. Quando nos deparamos com seres de elevada moral não podemos ignorar quanta abnegação, quanta renúncia e esforço pessoal foram necessários para que se elevassem àquele estado de pureza espiritual; ninguém nasce pronto, tudo é construído mediante esforço individual - aí o mérito.

Sobre o que foi exposto, alguns questionamentos podem ser formulados: Deus poderia criar seres superiores, moralmente e intelectualmente, mas como eles veriam a si mesmos? Não seria tirado deles a alegria da conquista pessoal, o mérito pelo esforço? E como encarariam os inferiores, que moral teriam sobre eles? Qual a experiência que poderiam transmitir se foram concebidos sem mácula?
Concluo com uma frase do espírito Chei Ai Min:
"Nenhum passo é mais belo do que aquele que leva a Deus".